segunda-feira, 14 de junho de 2010
A Espiritualidade do Descanso
Por Caio Fábio
Durante muitos anos eu julguei que esse mandamento de Jesus era para os outros, não para mim. Então pus-me a trabalhar na intenção de “remir o tempo, pois os dias são maus”.
O que somente a experiência revela é o seguinte:
1. Jesus viveu apenas 3 anos de intenso ministério e ainda assim julgou que era preciso parar e se separar do bulício da vida e das necessidades humanas a fim de repousar, de comer em paz e de renovar as forças do ser.
2. Sendo Ele quem era, ainda assim, não brincou com a encarnação. Trata-se de Deus respeitando os limites da condição humana.
3. Desse modo fica-se sabendo que nem Deus em Cristo prescindiu da necessidade do repouso. E as implicações disso são óbvias e simples: mesmo a mais genuína e legitima espiritualidade não pode prescindir dos limites do corpo e da alma. Portanto, qualquer projeto de espiritualidade que pretenda existir acima da condição humana está fadado ao fracasso e à doença!
No arroubo da juventude, estimulado pela energia missionária de potro, corri como quem tinha que salvar o mundo inteiro, e cansei...
As conseqüências são inevitáveis:
1. O coração perde o ardor não por falta de amor, mas por absoluta necessidade de energia.
2. Vivendo extenuado, tudo se torna pesado. E nada é mais stressante que o ministério, se vivido com paixão, calor e intensidade.
3. A alma cansada pede férias. E, muitas vezes, pede férias até mesmo do ministério. O que vem na seqüência é que já não se sabe mais se se está cansado pelo cansaço ou se se está cansado do ministério.
4. O próximo passo é que toda a pilantragem que nos circunda vai fazendo o coração cansado achar que está perdendo tempo, malhando em ferro frio, e, então, surge o marasmo, a descrença e a tristeza.
5. Cansaço deprime, esgota e des-romancia a alma. Então, vem a falência dos ideais e inicia-se o processo de trabalhar mecanicamente.
6. O fim disso é imprevisível. Uns adoecem psicologicamente. Outros anestesiam-se a fim de continuar “empurrando com a barriga”. E outros ainda, caem no caminho da auto-indulgencia, pois, se tudo é tão ruim, por quê não dá a si mesmo um pouco de auto-compensação?
Escrevi isto quando estava voltando da floresta no início deste ano de 2003!
Meu pai tem casa por lá. As cutias comem no fundo do quintal, os rastros dos gatos maracajás aparecem na areia branca e fina, os pássaros gorjeiam aos milhares e os sapos são tenores, barítonos, baixos e sopranos!
E as guaribas?—uma espécie de macaco vermelho—cantam em grupos de 300 ou 400 todas as madrugadas de lua cheia, num coral de vozes guturais e barítonas, regidas pelo macaco chefe, o capelão!
E os igarapés? e as cachoeiras? e os peixes do paraíso, após cada provada não dá mais para comer peixe de mar, carregado de maresia?
E meus amigos caboclos? e suas histórias tão puras? e suas dores tão simples e não neuróticas? e suas alegrias tão singelas? e sua fidelidade tão florestalmente macha e digna?
Ah! hoje, mais do que nunca, entendo porque meu pai nunca quis vir para estas plagas—quase pragas—locais e urbanas, onde tudo e todos ofegam até enquanto dizem descansar!
E é essa vida no descanso da Graça que quero viver. E é nessa paz de poder ser de Deus e servi-Lo sem messianismo de nenhuma natureza que estou gostando muito de viver!
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